Fiscal do trabalho revela situação assustadora no RS
Vanius João de Araújo Corte, gerente do Ministério do Trabalho em Caxias do Sul, explora as razões pelas quais os trabalhadores modernos ainda se sujeitam a condições semelhantes à escravidão em pleno século 21. Ele cita casos recentes ocorridos na Serra Gaúcha e no Sudoeste, onde 303 pessoas foram resgatadas de trabalho análogo à escravidão, tornando o Rio Grande do Sul o segundo estado com mais flagrantes de fiscalização.
Em entrevista ao Brasil de Fato RS, Corte ressalta que, apesar do aumento da escravidão moderna no estado, a estrutura de fiscalização tem sido desmantelada desde o golpe parlamentar contra a ex-presidente Dilma Rousseff em 2016 e da ascensão de Michel Temer, sendo agravada pelos quatro anos de destruição do mandato de Jair Bolsonaro.
Corte também destaca os malefícios da reforma trabalhista, que resultou na perda de direitos dos trabalhadores, a “uberização” do mercado de trabalho, o retorno do trabalho infantil e como essas mudanças afetaram a mentalidade dos trabalhadores diante da exploração.
Confira partes da entrevista
Brasil de Fato RS: O Brasil ficou perplexo com a quantidade de flagrantes na Serra gaúcha, mais especificamente na colheita de uva, envolvendo trabalhadores de outras regiões. É pouco provável que esse procedimento passasse a acontecer somente em 2023 e não fosse um processo desenvolvido ao longo de vários anos. O que pode dizer sobre isso?
Vanius Corte: A nossa área de fiscalização abrange 43 municípios, e o início do verão é uma época que tem muita produção. Tinha muito aquela situação dos vizinhos se ajudarem, onde os vizinhos de uma propriedade iam colher na outra, etc. E a gente fiscalizava e não notava isso como um grande problema. Era família, tinha alguns empregados, mas era pouco.
No ano passado, surgiu esse alerta para nós, dizendo: ‘Opa, não é bem assim!’ Começamos a identificar trabalhadores vindos de fora para a colheita em situação que não era lá muito boa. Só que fomos sacar isso no final da colheita, em meados de fevereiro. Então, nos programamos neste ano para fazer diferente. Dar uma atenção maior para a questão da uva. E foi um horror. Era melhor não ter começado. Levantamos o tapete e tinha muita coisa embaixo.
O gráfico do Radar SIT, que mostra a evolução do trabalho similar à escravidão no Brasil indica que os flagrantes vinham caindo até 2017 quando começa a haver um avanço culminando com os números impressionantes de 2023. A que se deve tal comportamento?
Tem muito a ver com o fim dos governos Lula e Dilma e a ascensão dos governos Temer e Bolsonaro. Claro que não tem nada pior que o governo Bolsonaro, em todos os sentidos. Mas, na área trabalhista, o governo Temer foi um desastre completo. Foi o Temer que começou esse desmanche na área trabalhista. Aprovou a lei das terceirizações, que é um absurdo, possibilitando a terceirização em todas as atividades, inclusive na atividade fim. Isso é que desencadeou todas essas operações daqui.
A reforma trabalhista, a lei da terceirização, além de serem muito ruins, são problema também do ponto de vista do significado. Passaram um significado para a população em geral e para os empregadores em particular que não existia mais lei.
Confira a entrevista completa aqui.
Foto: Arquivo Pessoal