Especial Carandiru. Parte II: Pavilhão com cheiro de chumbo e sangue

A Tropa de Choque já estava preparada, os oficiais tinham em seu poder submetralhadoras Beretta nove milímetros e fuzis Parafal 7.62. Ambos têm em sua cinética, com apenas um click, a opção de tiros normais ou intermitentes, ou seja, em forma de rajadas. Os homens do segundo escalão, tinham a tiracolo, espingardas calibre 12 e os soldados levavam consigo revólveres calibre 38. Às 16h, eles tomam a frente do Pavilhão 9, uma enxurrada de facas artesanais, “naifas” na gíria penitenciária, estiletes e alguns canos de PVC quebrados do encanamento são atirados pelas janelas. Para à PM eram os presos os atacando, mas na verdade, eram os presos de desfazendo de tudo que pudesse ser identificado como arma. O próximo passo foi chamar um dos bombeiros que estava próximo e solicitar que com o auxilio de um alicate hidráulico arrombasse o grande cadeado posto no portão principal do pavilhão.

Na subida aos pavimentos, os PM´s escorregavam. Era o óleo jogado pelos presos. 16h20. Gritos de ambos os lados. A partir daí, rajadas de metralhadora. Alguns presos aguardavam nus, era uma forma de não mostrar resistência. Os que ainda ficavam no corredor eram exterminados à base de chumbo que, saia do cano dos revólveres.

https://infodiretas.com.br/relembre-o-massacre-do-carandiru-parte-i-a-manha-do-dia-2/

Com a falta de notícias, parentes de detentos e os PM´s preteridos da ação in loco, entravam em confronto a todo instante na Avenida Cruzeiro do Sul. Já na parte de dentro, quem havia escapado das balas, das mordidas dos cães e de sessões de espancamento no corredor polonês era obrigado a carregar os feridos para a enfermaria e os cadáveres para o grêmio recreativo; faltou espaço. Às 17h a operação dentro do Pavilhão 9 está encerrada. As primeiras ambulâncias levando presos feridos começam a deixar às dependências do Carandiru rumo ao PS de Santana. Sem mencionar feridos, o número que se tem são de oito mortos.

O domingo, 4, iniciou já com os números fechados daquela meia hora fatídica da tarde de sexta-feira, 111 homens executados pela policia militar. Os funcionários do quadro do IML que estavam de folga foram chamados às pressas, todos os que tinham condições de trabalho retomaram seus postos devido à grande carga de trabalho. Os corpos tinham pintados à tinta números, que seriam utilizados para identificação. Como a maioria estava em estado deplorável, com tiros no rosto e marcas de bala que causaram grandes estragos, alguns com até mais de dez tiros, os funcionários abortavam os parentes que queriam entrar no posto. Mesmo sendo direito do cidadão, os servidores do IML tinham compaixão pelos parentes, sabiam que cenas como aquelas provocaria sequelas pelo resto de suas vidas.

Os primeiros corpos começaram a ser enterrados na tarde de segunda-feira, 5, em covas rasas, lado a lado uma das outras no Cemitério de Vila Nova Cachoeirinha, na zona Norte. Enquanto parentes enterravam seus entes o governo ainda batia cabeça em confeccionar a lista oficial dos 111 detentos executados. Isso só foi ocorrer no final do dia seis de outubro.

Leia amanhã, o perfil dos mortos e a força bélica dos dois lados.