Massacre do Carandiru: o resultado que traduz os dias de hoje

O domingo, 4, iniciou já com os números fechados daquela meia hora fatídica da tarde de sexta-feira, 111 homens executados pela policia militar. A palavra massacre nunca foi mencionada pelo governo estadual e principalmente pelos comandantes de tal operação. Nem o governador Luiz Antonio Fleury (PMDB), o secretário de segurança pública Pedro Campos e muito menos os inúmeros oficiais que adentraram ao Carandiru utilizaram o termo. Quando questionado da chacina Fleury se esquivou dizendo que não era secretário, “tirando o corpo fora”, passando a responsabilidade das declarações ao chefe imediato dos PMs.
Os funcionários do quadro do IML que estavam de folga foram chamados às pressas, todos os que tinham condições de trabalho retomaram seus postos devido à grande carga de trabalho. Os corpos tinham pintados a tinta números, que seriam utilizados para identificação. Como a maioria estava em estado deplorável, com tiros no rosto, marcas de bala que causaram grandes estragos, e alguns com até mais de dez tiros, os funcionários abortavam os parentes que queriam entrar no posto. Mesmo sendo direito do cidadão, os servidores do IML tinham compaixão pelos parentes sabiam que cenas como aquelas provocaria sequelas pelo resto de suas vidas. Corriam para retocar ar marcas de bala e sofrimento estampada no rosto dos mortos. Funcionários do IML já acostumados a verem cadáveres choravam ao verem os corpos. Ainda no domingo, o IML contava 112 corpos de vitimas do Carandiru em suas dependências, eram 68 no IML Central, nove na zona leste, 17 na zona oeste e outros 17 na zona sul.
Familiares de presos checam informações com funcionários do presídio Foto: Arquivo/O Globo
Familiares de presos checam informações com funcionários do presídio Foto: Arquivo/O Globo


nellie solitrenick o gloo
Corpos lotaram IMLs da cidade. No total, 111 pessoas morreram no Massacre do Carandiru, em 2 de outubro de 1992 Foto: Nellie Solitrenick/O Globo
Os primeiros corpos começaram a ser enterrados na tarde de segunda-feira, 5, em covas rasas, lado a lado uma das outras no Cemitério de Vila Nova Cachoeirinha, na zona Norte. Enquanto parentes enterravam seus entes o governo ainda batia cabeça em confeccionar a lista oficial dos 111 detentos executados. Isso só foi ocorrer no final do dia seis de outubro.  Em 2017, ano este que completa a dolorosa marca de 25 anos do episódio, os familiares aguardam pelas indenizações trabalhadas pela Promotoria; ninguém foi preso, e, nem sequer verdadeiramente condenado. O comandante da ação coronel Ubiratan Guimarães foi afastado uma semana depois do ocorrido de seu cargo. Em 2001 foi acusado de homicídio e condenado, em junho, a 632 anos por 102 das 111 mortes (seis anos por cada homicídio e vinte anos por cinco tentativas de homicídio). Não ficou um dia preso, sendo absolvido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça. Ubiratan foi assassinado em setembro de 2006, com um único tiro abaixo do mamilo esquerdo. Logo após sua morte, no muro do prédio onde morava foi pichado “aqui se faz, aqui se paga”, com referência ao Massacre do Carandiru que o coronel coordenou. Exatos 10 anos após o extermínio, em outubro de 2002 o Complexo do Carandiru começou a ser esvaziado sendo implodido quase que totalmente dando vida ao hoje Parque da Juventude.
No ano passado, o desembargador Ivan Satori suspendeu os julgamentos que condenaram os PMs a centenas de anos pela matança. Criticado, ele justificou que a ação ocorreu em legítima defesa.
Presídio foi implodido em 2002, dez anos após o episódio Foto: Mauricio Lima/AFP
Presídio foi implodido em 2002, dez anos após o episódio Foto: Mauricio Lima/AFP